domingo, 25 de janeiro de 2009

A cada dia, sua agonia... e uma nova tecnologia...


Por Nicia cristina Rocha Riccio

“A cada dia, sua agonia...”. Ouvi esta frase de uma professora (que já é avó) referindo-se a uma fala de sua avó. É um pouco isso que sentimos frente à revolução das novas tecnologias de informação e comunicação. Embora nem tão novas assim, e nem revolução no sentido original da palavra – retorno ao ponto de partida (certamente não ao paraíso, como pensavam as classes populares em relação às revoluções burguesas). No entanto, uma nova a cada dia, gerando uma agonia permanente e uma angústia aparentemente sem solução.
Como se sentirá, por exemplo, um professor do ensino fundamental (com 15, 20 anos de carreira) de uma escola pública (precisamos ir para o interior, ou da própria capital?) do estado da Bahia, frente a essas novidades tecnológicas que são pregadas como fundamentais para a melhoria da qualidade do ensino? Ditas como indispensáveis para que a escola entre e faça parte da sociedade do conhecimento? Como se sentirá um professor que, nunca tendo tocado num mouse, depara-se com uma turma de alunos ávidos por conhecer, tocar, experimentar – sem medo de ser feliz – essa novidade que é o computador? Como o professor pode manter o seu lugar no “centro” do processo ensino-aprendizagem, como sempre soube que deveria ser, quando dispunha apenas de quadro negro e giz?
Mas, antes de mais nada, será que o lugar do professor ainda deve ser este centro? Esta é uma questão amplamente discutida na academia, e já se tem um consenso de que o professor não pode mais ocupar este centro do processo ensino-aprendizagem – estando ou não as novas tecnologias envolvidas neste processo. Discute-se hoje sobre um centro que se desloca constantemente, uma organização em rede onde cada nó desta rede pode ocupar, momentaneamente o centro do processo. Assim pode-se ter uma atenção a cada elemento envolvido, a cada momento. O papel do professor, nesta visão, é o de um mediador na construção do conhecimento que possibilita e promove o deslocamento deste “centro” entre cada participante (inclusive ele mesmo) tendo como objetivo final a troca e a colaboração entre todos, de forma que todos possam contribuir com seus conhecimentos e experiências prévios na construção do conhecimento coletivo.
O aluno, então, passa a ser visto não como um “ser sem luz” – significado muitas vezes atribuído, de forma errônea, à palavra aluno – mas como um partícipe tão importante como qualquer outro e que pode e deve atuar de forma ativa e colaborativa no seu processo de busca/construção de conhecimento. E aqui vale uma ressalva ao real significado da palavra “aluno”, na sua origem latina: aquele que precisa de/busca por alimento – alimento aqui entendido como o saber, o alimento da alma.
Com esta nova estrutura, já não é visto de forma crítica que o aluno saiba mais que o professor em algum aspecto. E, certamente, no que diz respeito ao uso das novas tecnologias, o aluno, ávido pelas novidades, abre-se muito mais facilmente a este mundo computacional – tão assustador para o professor que nunca teve a oportunidade de vivenciá-lo de forma lúdica e leve. Pelo contrário, ao professor este mundo computacional se apresenta como uma exigência da globalização, uma nova necessidade para a qualidade do ensino. E, visto de uma forma tradicional onde o professor “tem que saber tudo”, estas exigências se transformam numa cobrança (inclusive dele mesmo) de dominar um saber para o qual não está preparado.
Não queremos aqui negar a importância das novas tecnologias, nem a clara necessidade de formação continuada do professor nessas novas tecnologias. Afinal, elas estão aí, e podem potencializar esta nova maneira de ver a estrutura do processo ensino-aprendizagem, além da inegável possibilidade de conteúdo aberto e democratizado que podemos vislumbrar através da rede. E sem uma adequada formação do professor, estas possibilidades podem se tornar inviáveis. Queremos apenas enfatizar que o professor, neste novo entender do seu papel, pode se permitir sair do centro e aprender junto com o aluno; e para isso deve buscar dentro de si a humildade de afirmar que não sabe tudo, a humildade de afirmar a sua angústia.
Verdade seja dita: essa angustia não é “privilégio” dos que conhecem pouco, é um sentimento universal diante das mudanças. Se vivemos num mundo de mudanças tecnológicas, o foco vai para elas, e todos os nossos problemas parecem ser causados por estas mudanças que nos cercam por todos os lados. Por esse tempo que parece acelerado e que não nos dá tempo de alcançar cada novidade que surge a cada dia. Por essas novidades que não alcançamos e que colocam nossa auto-estima abaixo dos limites aceitáveis. Alguém pode se pegar ouvindo, ou falando, algo do tipo: “antigamente, nada disso acontecia...”.
Ora, mas aquela avó de uma avó... quando será que ela dizia aquilo? Há 40, 50 anos atrás? Que realidade era aquela onde já existia, a cada dia sua agonia? Essa agonia era gerada por que mudanças? Não importa... as mudanças vêm de todos os lados e a todo tempo (a mudança tecnológica é apenas uma delas). Mas essa angústia é muito mais um sentimento que vem de dentro, gerada pela forma desesperada como queremos abarcar tudo... seja o que for este tudo. Não podemos, nem temos que tentar abarcar tudo. Temos sim, que viver a cada dia, sua agonia... mas sem permitir que esta agonia se torne maior que nós mesmos, e nos impeça de olhar as mudanças com olhos esperançosos.

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