Antes que 2012 termine, há que refletir sobre o que boa parte da
opinião pública – a parte que não embarca na politicagem da oposição
demo-tucano-midiática – já intui e comenta, que 2013 baterá o recorde de
todos os anos anteriores do pós-redemocratização em termos da
infatigável guerra da oposição midiática contra o governo federal e o
partido de sua titular.
E a primeiríssima reflexão é a de que, hoje, é muito menor o
contingente que tenta desqualificar sem discussão a premissa golpista em
um país de tão larga tradição nessa prática compulsiva de uma elite que
luta ferozmente para manter privilégios que fizeram do Brasil o país
virtualmente mais injusto do mundo – pois os mais injustos são países
paupérrimos da África.
Há menos de um ano, quando se falava em golpe diziam que não havia
“clima” para tanto, que seria paranóia etc. Hoje, o discurso persiste
inclusive entre setores que se dizem “de esquerda”. Todavia, aumentaram
exponencialmente os que enxergam o esforço golpista, que se traduziria
em mais uma tentativa de golpe “institucional” na América Latina
As recentes experiências golpistas hondurenha e paraguaia, como se
sabe, sucederam a tentativa venezuelana lá em 2002, desfechada sem
sucesso, ao contrário das duas que sobrevieram e que vingaram, fazendo
salivar aqueles que, ao longo do século XX, espalharam quarteladas
golpistas pela região.
Recentemente, li no Twitter um desses militantes da mídia disfarçados
de “esquerdista” que, ironizando um texto meu, perguntava como seria
possível um golpe sem censura a jornais. Espantoso, não é mesmo? A gente
fica sem saber se é ignorância histórica ou má fé, pois é difícil achar
alguém minimamente escolarizado que não saiba o papel da imprensa no
golpismo nacional do século XX.
Mas vamos em frente. A segunda questão é a da razão para os flertes
com o novo modelo de golpe, o modelo “institucional” com o qual se
pretende tirar do cenário político candidatos de esquerda com alta
aprovação e expressivo eleitorado como Manoel Zelaya, Fernando Lugo e
Hugo Chávez.
Não me parece polêmico afirmar que a oposição tem cada vez menos
perspectivas de retomar o poder em 2014. Recentes pesquisas de opinião
dos institutos Datafolha e Ibope revelaram que o PT não tem um, mas dois
candidatos em condições de se eleger em primeiro turno. E que a
oposição conta com nomes cujo desempenho é fraquíssimo.
As razões para esse favoritismo do PT para as eleições de 2014
deveriam ser claras para todos, mas o fato é que a mídia, a oposição e a
militância oposicionista-midiática parecem que acabam acreditando
naquilo que inventam e difundem como fatos, mas que não passa de
distorções, invenções e desejos.
Há, pois, que entrar no terceiro tópico, o das armas que cada lado
tem para enfrentar a contenda que se avizinha, a de 2013, que só perderá
em virulência para a de 2014.
Do lado da oposição midiática, o armamento é farto, diversificado,
sofisticado e multibilionário. Apesar da oposição formal (partidária)
exangue, sem votos, sem propostas e que vai encolhendo a cada eleição,
há os grandes impérios empresariais, com destaque para os de comunicação
– pelo protagonismo e pelo poder –, e os não menos importantes
tentáculos do Judiciário e do Ministério Público.
Mas não é só. A CPI do Cachoeira revelou que a base aliada do governo
Dilma é infinitamente menor do que parece, pois o PMDB, o PSB e os
pequenos partidos de direita que a compõem já se revelaram inconfiáveis,
chegando a atuar em consonância com a oposição partidária, a mídia e os
braços destes no Judiciário e no MP.
Como para manter a base aliada é preciso fazer concessões para não
incomodá-la, a possibilidade de reação do governo e do partido de sua
titular se reduz drasticamente, como ficou claro, mais uma vez, na CPI
do Cachoeira, quando o fato de muitos peemedebistas serem donos de
veículos de mídia blindou a Veja naquela Comissão.
Os acordos escancarados entre a oposição formal e o PMDB foram ainda
mais longe, chegando a blindar, também, aquele que, com base em uma
fartura impressionante de provas materiais e testemunhais, pode ser
considerado o segundo homem do esquema criminoso goiano, que atingiu a
marca do bilhão de reais, fazendo os valores do mensalão “petista”
parecerem gorjeta. A impunidade de Marconi Perillo, assim, mostra quão
poderosa é a coalizão golpista.
O que, então, resta de armas ao governo Dilma e ao PT? Apesar de
menos rápidas e ruidosas, as armas desse lado não são desprezíveis. E a
“caneta” é a principal. Desta, decorrem o que uma perspicaz leitora com a
qual conversei por telefone dia desses chamou de “pacotes de bondades”,
dos quais decorre a popularidade estratosférica de Lula, Dilma e PT.
Mas tudo vem do fato de que esses atores governam o país, tendo como
produzir políticas públicas que fazem com que o eleitor reflita que não
dá para trocar o certo pelo duvidoso com base em discursos moralistas
entoados por aqueles que não têm a menor condição para fazê-los e em
discursos sobre a economia que se chocam com a realidade econômica da
sociedade.
A “caneta” do governo petista reduziu os juros de forma inédita no
país, aumentou os salários, praticamente extinguiu o desemprego, fez
disparar o crédito ao consumidor e, ainda que em ritmo infinitamente
menor, fez cair, de forma inédita, a concentração de renda.
Já foi amplamente explicado, nesta página, que a estratégia da
direita midiática faz todo sentido do mundo, pois simplesmente não tem o
que oferecer. As políticas sociais petistas como, por exemplo, o Bolsa
Família e as cotas nas universidades públicas vão se impondo contra os
discursos que tentavam desqualificá-las perante a sociedade.
O Bolsa Família, há tempos que só vem sendo criticado pelos
militantes da oposição midiática, pois os políticos oposicionistas não
têm coragem para atacar um programa tão popular. E agora são as cotas,
às quais até o governo tucano de São Paulo vai se rendendo, mesmo que
com reticências contra as cotas raciais. Mas está sendo quebrado o
paradigma.
Contudo, se o PSDB, o DEM e o PPS fossem vistos como partidos com
credibilidade para investirem no social, não estariam fora do poder.
Esses partidos, com os discursos virulentos de outrora contra políticas
sociais petistas e contra o modelo de desenvolvimento e gestão econômica
vigentes, carimbaram-se, ao lado da mídia, como agentes dos ricos.
Eis que chegamos à inviabilidade da disputa político-eleitoral como
forma de a oposição midiática retomar o poder. Teria que haver uma
hecatombe econômica no Brasil, com forte queda de renda e com expressivo
aumento do desemprego e da desigualdade para que vicejasse um desejo da
maioria por mudança.
Mudança só é desejada quando se está mal-acomodado, e não haverá
discurso sobre “pibinho” ou “corrupção” que faça a sociedade achar que a
sua vida vai mal justamente quando mais e mais pessoas vão sendo
incluídas no mercado de consumo de massas e no mercado formal de
trabalho.
Não que não haja desejo de mudança. Há e até ficou muito claro em
2012, com o impressionante desempenho do PT nas eleições ao vencer no
maior colégio eleitoral do país, São Paulo, capital que, até há alguns
meses, era considerada a mais sólida fortaleza oposicionista. Só que é
um desejo de mudança em favor do PT em vez de ser contra.
Com a resiliência do potencial eleitoral do PT e com a ausência de
perspectivas e de discurso da oposição, basta a menor reflexão para
concluir que esses poderes que anseiam pela retomada do poder para pôr
fim, sobretudo, à distribuição de renda em curso, não se conformarão em
ficar mais quatro anos fora do poder, a partir de 2014.
O golpe “institucional” à brasileira, pois, já está desenhado. Lula, o
“odiado” (pela direita microscópica e midiática) dificilmente deixará
de ser denunciado por iniciativa da mesma Procuradoria Geral da
República que dispõe, também, da prerrogativa de denunciar presidentes
da República.
Roberto Gurgel, o atual procurador-geral, pertence ao mesmo grupo
político – sim, o Ministério Público tem correntes políticas muito bem
definidas – do antecessor, Antonio Fernando de Souza, autor da denúncia
do mensalão “petista”. E ficará mais sete meses no cargo. Uma
eternidade, em termos de tempo para tentar inviabilizar Lula e Dilma
como candidatos potenciais à sucessão desta.
Quanto ao STF, ainda restam a Dilma duas indicações – uma para a vaga
do recém-aposentado Carlos Ayres Brito e outra que decorrerá da
aposentadoria precoce do ministro Celso de Mello.
Na hipótese de que o recém-nomeado Teori Zavascki se revele um
legalista como Ricardo Lewandovski, com José Antonio Dias Tófoli e com
duas novas indicações racionais por Dilma, seriam cinco ministros que,
ao menos em tese, barrariam o golpismo naquela Corte em meio a um total
de onze.
As ministras Carmem Lúcia e Rosa Weber dão esperança de comedimento
ainda que tenham se acovardado durante o julgamento do mensalão, mas só
no que tange ao núcleo político daquela ação penal, núcleo esse que a
mídia deixou muito claro que não aceitaria que não fosse condenado.
Assim, o jogo ficaria equilibrado.
Todavia, também no STF ainda restam vários meses de sobrevida ao
núcleo golpista, pois as novas nomeações para aquela Corte sempre
demoram a se concretizar.
Não chega, portanto, nem ao final de 2013 o prazo para a direita
midiática desfechar seu golpe “institucional”, limitando ao ano que
entra o prazo máximo para impedir que os candidatos do PT à sucessão de
Dilma dêem uma nova surra eleitoral na oposição demo-tucana, o que
obrigará o modelo nacional de golpe a se aproximar do modelo-relâmpago
do Paraguai.
http://www.blogdacidadania.com.br/2012/12/2013-o-ano-do-golpe/