sexta-feira, 27 de abril de 2012

STF extingue cotas de 100% para brancos nas universidades

Senhor Deus dos desgraçados!

Dizei-me Vós, Senhor Deus
Se é loucura, se é verdade

Tanto horror perante os céus

(…)

Quem são estes desgraçados

Que não encontram em Vós

Mais que o rir calmo da turba

Que excita a fúria do algoz

Quem são?

Se a estrela se cala,

Se a vaga à pressa resvala

Como um cúmplice fugaz,

Perante a noite confusa…

(…)

São os filhos do deserto,

Onde a terra esposa a luz

Onde vive em campo aberto

A tribo dos homens nus…

São os guerreiros ousados

Que com os tigres mosqueados

Combatem na solidão.

Ontem simples, fortes, bravos.

Hoje míseros escravos,

Sem luz, sem ar, sem razão. . .

Navio Negreiro, de Castro Alves

*

Assusta viver em um país em que é preciso apresentar números sobre a situação da maioria negra de seu povo apesar de que todos a encontram em cada rua, a cada esquina, a todo tempo.

É o vizinho que habita a calçada

Com mulher, filhos e humilhação

Oriunda de mera decisão

Da sociedade, do patrão e da madame

Do jovem rico e de sua indolência infame

Que rouba a vaga do que anseia pela razão

Que para o mancebo rico não faz noção

Eis que brindado com o direito de herança

Que pisoteia do negro a esperança

A pobreza que atinge brancos não é igual à que atinge negros. Desonestidade intelectual devia dar cadeia tanto quanto a material.

A mentira mais hedionda sobre cotas “raciais” que um partido que deveria servir ao povo esgrimiu na Suprema Corte de Justiça foi a de que a política afirmativa cotas não beneficia “pardos”, ainda que centenas de milhares deles já sejam beneficiados.

É mentira que a pobreza que a negros atinge seja a mesma que atinge ao branco. A do negro é muito maior e pior, como IBGE e IPEA comprovam.

97 milhões, entre 190 milhões de brasileiros, declaram ao IBGE que são afrodescendentes. Os negros, pois, somam 51% da população.

O IPEA diz que o salário médio do branco é de R$ 1,8 mil e o do negro, R$ 0,8 mil. Diz também que os que se declaram afrodescendentes são 70% dos pobres, 70% dos indigentes e quase 80% dos jovens que morrem por violência.

A Suprema Corte de Justiça de um país que tem 51% de afrodescendentes, tem 1 único magistrado negro e, no Congresso, só 8 % dos deputados são negros.

Na propaganda, nas novelas, nos bunkers dourados da elite branca, ditos “condomínios”, onde o egoísmo se resguarda da pobreza matizada, erigida pela mais pura vilania, a unanimidade racial de tons rosados e louros com um frio olhar azul ou verde deu o primeiro passo rumo à lata de lixo da história.

Não faltam números para provar que a pobreza, no Brasil, tem cor. Não faltam cenas que comprovam a cor da pobreza, a cor da humilhação, a cor da injustiça. O que falta é vergonha na cara a um setor minoritário e rico da sociedade. Vergonha de mentir impiedosamente e, ainda, afetando indignação.

A Suprema Corte do Brasil marca mais um tento no ranking da pacificação social, da igualdade, da verdade e da Justiça. Que cada voto, de cada magistrado, seja um libelo contra a hipocrisia desumana que pisoteia a imensa maioria deste povo brasileiro. Um libelo acusatório a uma minoria microscópica que tem a audácia de negar uma realidade que lhe lambe as faces a cada passo nas ruas.

Eliminado o produto da hipocrisia e da desonestidade intelectual, resta descobrir como instilar ética e sinceridade nessa parcela diminuta da nação que tanto mal vem produzindo à sua quase totalidade ano após ano, década após década, século após século.

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