Ler e assistir aos comentários dessa horda de “colunistas” da grande mídia brazuca sobre o mensalão é uma tortura que não deve estar passando despercebida à CIA em sua busca incessante por tais técnicas, já que, nos EUA, tortura é política de Estado largamente utilizada – quase sempre, contra prisioneiros não-americanos.
Há uma beleza árida na verdade e na honestidade mesmo quando se voltam contra as nossas crenças. Ninguém sofre com elas. Se você for culpado de alguma coisa e acabar sendo descoberto, não ficará indignado. Pode ficar com medo, envergonhado, mas nunca ficará indignado. Às vezes, pode ficar até aliviado.
A mentira e a desonestidade, não. Essas machucam, maltratam, fazem o espectador se remexer na cadeira como se tomasse choques elétricos. Mesmo se você não for o alvo da farsa sentirá uma sensação de impotência e de inconformismo que o provocará a agir como se fosse, porque a mentira e a desonestidade doem.
Agora, por exemplo, estamos sendo flagelados por esses mercenários que parecem se orgulhar do servilismo que dedicam aos patrões ao exercerem uma profissão que, ao abraçarem, comprometeram-se com a independência intelectual e com a reportagem dos fatos sejam eles quais forem, da forma mais fidedigna possível.
Oh, que surpresa, alguma coisa aconteceu no âmbito do escândalo do mensalão que foi produto de ilegalidades! Mas quem, alguma vez, negou isso? Ninguém. Absolutamente ninguém negou que houve práticas ilegais no esquema apelidado de mensalão.
Quando Lula disse que o mensalão é uma farsa, por certo não quis dizer que não houve ilegalidades. Ele mesmo disse isso, que foi traído por práticas dessa natureza. Foi traído por todos os acusados que tiverem sua culpa referendada pelo STF por distribuírem ou receberem recursos financeiros de origem ilegal.
A que farsa, então, Lula se referiu? Ora, ele já disse. E todos os que acompanham a sua opinião já disseram claramente: é farsa dizer que o governo Lula, através de José Dirceu, organizou um esquema de compra de apoio parlamentar. Essa é a farsa. Nada mais, nada menos.
E, como disse o comentarista de política Bob Fernandes, farsa é a mídia agir em relação ao mensalão como não age em relação a casos idênticos e até mais graves envolvendo partidos com os quais ela se acumpliciou.
Vemos, porém, esses mercenários contratados por essa meia dúzia de famílias que controla, em forma de cartel, a comunicação de massas, torturarem os que acompanham os fatos com atenção ao atingi-los com suas mentiras e desonestidade extremadas.
Os torturadores sabem exatamente a quem Lula se refere quando se diz traído, e sabem que ele chama de farsa a tese de compra de votos. E só. Todavia, fazem de conta que não sabem. É uma tática política, portanto, que se sustenta na prática do ex-presidente de não entrar em bate-bocas com quem julga ser perda de tempo.
Ora, alguém, em sã consciência, poderia, de alguma maneira, imaginar que o processo do mensalão chegaria ao Supremo Tribunal Federal e que o procurador-geral da República faria uma denúncia se todos os acusados fossem inocentes? É claro que não. Há leis no Brasil. Isto aqui não é uma republiqueta. Ninguém seria tão louco.
A grande tramóia, portanto, está em misturarem inocentes e culpados. E em tentarem distorcer o motivo da organização do esquema ilegal de arrecadação e distribuição de recursos financeiros com fins eleitorais.
Quem afirma que Marcos Valério é inocente além de ele mesmo e de sua defesa? Ninguém diria tal sandice. Ele, vai sendo provado, foi o grande agente corruptor que transitou por vários partidos e governos. Aproximou-se dos arrecadadores de recursos dos partidos, com toda certeza. Aproximou-se de petistas, tucanos, demos, peemedebistas, petebistas… E os corrompeu.
O que se Julga neste momento no Supremo não é o PT ou o governo Lula, portanto, mas um sistema de financiamento de campanhas eleitorais que admite recursos privados, facilitando a compra de políticos por setores do empresariado nacional, em última instância, pois só grupos dessa natureza têm recursos para comprar parlamentares.
São as bancadas dos planos de saúde, dos bancos, das operadoras de telefonia, da igreja católica, das igrejas evangélicas, de setores que fabricam desde absorventes higiênicos até máquinas de construção e, claro, da indústria de comunicação de massas…
Vá ver agora, leitor, o que pensam esses colunistas sobre o financiamento público de campanhas. Descobrirá que são todos contra. Até porque, não tocam no assunto. Muito pelo contrário: tentam renegar a relação entre financiamento de campanha e as investidas de Valério sobre governo e oposição (onde ela era governo), naqueles anos.
Neste blog sempre se defendeu que há culpados e inocentes entre os 38 acusados no inquérito do mensalão. A mídia, com os primeiros votos do relator e do revisor do processo pedindo condenação de alguns dos acusados, apresenta esses votos ao público como provas de que suas teorias sobre compra de votos pelo governo Lula estivessem certas.
Contudo, os “colunistas” que vibram com essas primeiras condenações parciais e enaltecem o trabalho dos juízes que condenam, podem escrever aí que desandarão a tentar desacreditá-los se ou quando absolverem.
O cidadão consciente, bem-intencionado, interessado unicamente no bem comum e no aprimoramento das instituições – valores que constituem só o que nos salvaguarda a todos indistintamente –, precisa entender que é imperioso existir um parâmetro único para definir se alguém deve ou não pagar por uma acusação: a decisão da Justiça.
O que se vê na mídia, porém, são tentativas de contrabandear para dentro do julgamento do mensalão aquilo que a Justiça não aceitou, não decidiu e nem decidirá. A Justiça recusou, reiteradas vezes, a inclusão do ex-presidente Lula no inquérito, mas a mídia quer transformá-lo, e ao seu período na Presidência, em réus.
A estridência midiática pode fazer alguém acreditar que é capaz de moldar a realidade e a história. Não é. Quem pode fazer isso, em uma democracia, é o povo. E só através das urnas. Pesquisas de opinião recentes provam isso ao darem conta de que a mídia continua fracassando ao tentar condenar Lula e seu governo.
Por fim, vale repisar possibilidade que pode se abater sobre quem só enxerga o momento, sendo incapaz de enxergar um pouco mais longe: certas absolvições, se ocorrerem, serão menos benéficas para os absolvidos do que serão nefastas para os que tentaram fazer prevalecer a tese de compra de votos. Quem viver, verá.
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