No último sábado, fui um dos palestrantes em um encontro de
blogueiros em Curitiba. A “mesa” de debates de que participei teve como
tema “Comunicação e Democracia”. Como disse na oportunidade, aqui no
Brasil uma sempre foi usada contra a outra.
Há quase sessenta anos, um presidente da República deu um tiro no
peito por causa da comunicação. Dez anos depois, a comunicação pediu,
tramou, ajudou a instalar e, depois, a sustentar uma ditadura sangrenta
que durou duas décadas.
Nesta semana, a comunicação no Brasil trata de censurar fatos em um
país fronteiriço que, por ser o maior produtor de petróleo do planeta,
encerra importância geopolítica e econômica de tal magnitude que atrai
os olhares do mundo.
Sob a batuta dos Estados Unidos, a comunicação brasileira trata a
política interna da Venezuela à base de omissões e distorções dos fatos
ou, simplesmente, à base da mais legítima censura.
Antes de prosseguir, há que contextualizar os fatos.
A vitória apertada do presidente recém-eleito do país vizinho não
difere, por exemplo, da que – graças a Deus – obteve Barack Obama nos
Estados Unidos em novembro do ano passado, quando derrotou o republicano
Mitt Romney por margem tão apertada quanto o venezuelano Nicolás Maduro
derrotou o adversário Henrique Capriles – Obama obteve 2,3 pontos de
vantagem e Maduro, 1,75 ponto.
Embora os EUA ou a mídia brasileira não tenham pedido recontagem dos
votos nos Estados Unidos só porque a vitória de Obama não foi mais
ampla, ambos põem em suspeição a eleição venezuelana apesar de o sistema
eleitoral do país sul-americano ser mais confiável do que o do país
norte-americano.
Até aí, política é política e o debate público, por si só, dá conta
de pôr os pingos nos is. O problema é quando um comportamento
literalmente fascista dos derrotados na Venezuela, que não querem
aceitar a derrota, conta com a cumplicidade da imprensa brasileira.
Os venezuelanos saberão resolver seus problemas, espera-se. Mas o
nosso talvez seja pior do que o deles, pois na Venezuela a censura se
tornou impossível devido à pluralidade da comunicação, que há para todos
os gostos.
O comportamento dos derrotados na Venezuela vem sendo criminoso.
Capriles, inconformado com a derrota, exortou seus seguidores a irem às
ruas protestar contra uma vitória que, até prova em contrário, foi
legítima como a de Obama no ano passado.
Sendo condescendente, pode-se aceitar que Capriles tenha perdido o
controle de seus seguidores e que os atos de violência que desencadearam
por toda Venezuela entre a madrugada de segunda-feira e a manhã de
terça não tenham sido orquestrados por ele.
Aliás, ao recuar da manifestação que convocara para esta
quarta-feira, o candidato derrotado parece ter percebido que sua
exortação aos seus seguidores poderia leva-lo às barras da lei, porque
sua primeira convocação teve como saldo, até agora, sete mortos e
incontáveis atos de vandalismo por toda a Venezuela.
Uma onda de vandalismo e violência tomou o país vizinho. Sete
seguidores de Nicolás Maduro foram assassinados nos estados Zulia,
Táchira e em Caracas, e 61 pessoas ficaram feridas, algumas com
gravidade.
Ao todo, nove estados reportaram agressões de variados tipos. A mais
macabra, porém, foi a de um seguidor de Maduro que foi queimado vivo.
Segundo relatos do governo venezuelano, os assassinados tentaram
defender unidades dos programas sociais Pdval, CDI e Mercal, que
oferecem de atendimentos de saúde por médicos cubanos a venda de
alimentos por preços mais baratos que os do comércio.
Os CDIs são dirigidos por médicos cubanos e até pacientes teriam sido atacados.
Há relatos, também, de ataques a tevês e rádios comunitárias
simpatizantes do governo. As tevês estatais Venezolana de Televisión
(VTV) e Telesur foram cercadas pelas hordas oposicionistas e só não as
atacaram porque a polícia interveio.
Várias sedes do partido do governo, o Partido Socialista Unido da
Venezuela (PSUV), teriam sido depredadas e incendiadas. Praças públicas e
pontos de ônibus teriam sido destruídos. Entregas de alimentos nos
mercados do governo teriam sido impedidas e a mercadoria roubada pela
horda ensandecida.
O governo venezuelano e incontáveis matérias nas tevês estatais
reportam que tudo que tivesse o logotipo do governo era atacado pelos
que, alegadamente, foram às ruas, sob instigação de Capriles, para
promover um “panelaço pacífico”.
As redes estatais inclusive mostraram imagens de depredação nos
centros médicos do estado Miranda, governado por Capriles,
identificando-os como sendo os de La Limonera e de Trapichito. Esses
ataques teriam resultado em 3 mortos que tentaram defender as
instalações.
Outros relatos dão conta de ataques no estado Carabobo, na cidade de
Valencia – onde este blogueiro esteve várias vezes a trabalho. Lá, oito
centros médicos teriam sido atacados e um deles, incendiado.
Os mortos têm até nome. Um deles é o dirigente do PSUV Henry Rangel.
No estado Zulia, outro militante do PSUV foi assassinado diante da sede
do Conselho Nacional Eleitoral, quando os seguidores de Capriles ali
protestavam e a vítima os xingou. Em Caracas, o militante do PSUV Luis
Ponce também foi assassinado enquanto tentava defender o centro médico
de La Limonera.
Aliás, o uso do condicional, aqui, é mera formalidade, pois a Telesur
mostrou imagens de depredações ao longo da última terça-feira e 135
agressores foram presos em flagrante.
Se quiserem argumentar que é tudo invenção do governo, as imagens e
as centenas de testemunhas provam que violência houve. Podem, então,
argumentar que foi o governo que pôs hordas nas ruas para praticarem
violência e pôr a culpa na oposição, mas há gente presa em flagrante,
acusada de assassinatos e, segundo o governo, com filmagens e fotos das
agressões.
Seja como for, haverá tempo de sobra para deslindar esses ataques. E a
extensa cobertura de redes de televisão e jornais internacionais
facilitará ainda mais o esclarecimento desses fatos.
O que não se pode aceitar, porém, é que fatos dessa gravidade sejam
literalmente ocultados pela dita grande imprensa brasileira, que se
limitou a relatar que houve “choques” com “7 mortos” na Venezuela por
ação “dos dois lados”.
Não há relatos de ataques promovidos pelo governo, não há depredações
de sedes de partidos de oposição, não há um só nome de um morto da
oposição, não há uma só imagem em foto ou vídeo de governistas
praticando violência ou vandalismo.
O Jornal Nacional, em sua edição de terça-feira, ocultou tudo isso. A
Folha de São Paulo, na edição desta quarta-feira, não dá um só detalhe
sobre as vítimas fatais e sobre os atos dos oposicionistas. Os outros
grandes meios de comunicação brasileiros fizeram exatamente o mesmo.
O público desses veículos não sabe um dado crucial: todos os assassinados são governistas. Todos.
Há corpos, há nomes dos corpos e nenhum deles é da oposição. Há sedes
do partido do governo e unidades de programas sociais do governo
depredados e basta ir a eles e comprovar.
Inclusive, o mero exercício da lógica permite entender que o governo
não teria por que promover uma farsa dessa magnitude, pois venceu a
eleição. A quem interessa o caos? Aos que perderam, claro. Ao governo
interessa a tranquilidade diante do resultado.
Grupos de mídia como Organizações Globo, Grupo Folha, Grupo Estado,
Editora Abril vivem acusando quem pede regulação da mídia, sobretudo o
PT, de quererem “censura”. A crise na Venezuela, porém, mostra quem não
apenas quer, mas pratica censura no Brasil.
http://www.blogdacidadania.com.br/2013/04/ha-censura-no-brasil-sim/
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