a fornalha onde os votos são queimados |
Em março, pouco menos de 120 cardeais da Igreja Católica decidirão
quem é o novo líder espiritual de 1,1 bilhão de pessoas. Isolados no
Vaticano, tomarão uma decisão de grande impacto no mundo, mas cercada de
segredos e reservada apenas a eles, seguindo o costume de pouca
transparência da hierarquia católica. Ainda que o conclave seja secreto,
assim como as opiniões dos cardeais, alguns nomes surgem como favoritos
para suceder o alemão Joseph Ratzinger, conhecido desde 2005 como Bento
XVI.
A principal estrela do conclave para suceder Bento XVI parece ser
Angelo Scola, de 71 anos, arcebispo de Milão, a maior diocese da Europa.
Próximo a Ratzinger, Scola é integrante do Comunhão e Liberação, um
movimento conservador bastante ativo no mundo católico, o que dá a ele
apoios importantes nos movimentos religiosos. Scola é um defensor do
papel central da Igreja Católica na sociedade e defende que ela tenha
voz ativa em discussões a respeito de costumes, política e economia.
No período em que foi Patriarca de Veneza, Scola ficou conhecido pela
energia aplicada em seus afazeres de líder religioso. Para ele, os
cristãos têm um sério problema de comunicação com a sociedade, pois
apelam para o moralismo “em vez de dar razões, de convencer”.
A força de Scola pode variar conforme a influência que o atual papa
exerça no conclave. Federico Lombardi, o porta-voz do Vaticano, e Georg
Ratzinger, irmão do papa, afirmaram que Bento XVI não vai tentar
interceder junto aos cardeais. Em entrevista ao jornal Financial Times,
Giuliano Ferrara, editor do jornal Il Foglio, que previu a renúncia de
Bento XVI em 2012, afirma que o atual papa já pode ter garantido sua
influência nos últimos anos. “Ele pode já ter um acordo sobre seu
sucessor, mas de qualquer forma devemos esperar que ele tenha voz sobre
quem virá depois”, diz Ferrara.
A influência de Ratzinger se dá porque ele nomeou 67 dos 117 cardeais
que hoje participariam do conclave, aqueles com menos de 80 anos.
Ratzinger teria feito as escolhas de modo a manter o conservadorismo
como ideologia majoritária na cúpula do Vaticano. Tudo isso, entretanto,
não serve como garantia para Scola.
Além dele, há outros 27 italianos entre os prelados e não se sabe ao
certo qual é a relação entre eles. Mauro Piacenza, de 66 anos, prefeito
da Congregação do Clero, e Gianfranco Ravasi, 71 anos, presidente do
Conselho Pontifício de Cultura, são outros italianos bem cotados.
Outro conservador com boas chances é o canadense Marc Ouellet,
prefeito da Congregação dos Bispos, terceiro cargo mais importante no
Vaticano. Ouellet, ex-arcebispo de Québec, manteria algumas das rígidas
posições da Igreja Católica, como na questão do aborto. Em 2010, ele
chegou a afirmar que abortar uma gravidez era um “crime moral” mesmo em
caso de estupro.
Uma papa do mundo em desenvolvimento?
Adicionar legenda |
Como ocorreu em 2005, há muitas especulações a respeito da
possibilidade de o novo papa ser de um país em desenvolvimento, onde
está hoje a maior parte dos católicos.
Dos cinco brasileiros que participam da votação, dois nomes são
cotados: João Braz de Aviz, ex-arcebispo de Brasília e atualmente
prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as
Sociedades de Vida Apostólica, e dom Odilo Scherer, arcebispo de São
Paulo, a maior diocese brasileira. Dom Odilo é conhecido por dar ênfase
ao trabalho de evangelização da Igreja e por tender a posições menos
conservadoras que as de Ratzinger.
Assim como dom João de Aviz, dom Odilo tem um trabalho ligado às
populações pobres, uma característica do catolicismo no Brasil, que pode
se tornar um trunfo na eleição caso os cardeais queiram realizar esta
guinada na atuação do Vaticano.
Outros latinos cujos nomes são cotados são o argentino Leonardo
Sandri, prefeito da Congregação das Igrejas Orientais, e o arcebispo de
Tegucigalpa, o hondurenho Oscar Maradiagua. Maradiagua, de apenas 61
anos, é comparado a João Paulo II por conta de seu carisma, mas pode ser
uma opção muito “à esquerda” para o Vaticano.
Entre os cardeais africanos o principal nome é o de Peter Turkson, de
Gana, prefeito do Conselho Pontifício para a Justiça e a Paz. Adorado
em seu país e entre os católicos do oeste da África, Turkson é descrito
com muitas palavras elogiosas pelos colegas. No ano passado, entretanto,
Turkson se envolveu em uma grande polêmica ao exibir para um grupo de
bispos um vídeo do Youtube com previsões estatisticamente duvidosas a
respeito da “islamização da Europa”.
Domínio é europeu
Ainda que haja muita especulação sobre a possibilidade de um papa do
mundo desenvolvido, a possibilidade parece pequena. Hoje, 117 cardeais
poderiam participar de um conclave em março, mas o número pode variar
conforme a data em que as reuniões tiverem início, já que três prelados
fazem aniversário em março. Levando em conta os 117, 61 cardeais são
europeus, sendo 28 da Itália, seis da Alemanha, cinco da Espanha, quatro
de França e Polônia, dois de Portugal e 12 de outros países. Há 11
africanos e 19 latinos (sendo cinco do Brasil e três do México).
Como se vê, para isso se concretizar seria necessária uma mobilização
sem precedentes de cardeais europeus para ceder a liderança da Igreja
Católica a um não europeu pela primeira vez. Esperar isso em 2013,
talvez, seja como esperar um milagre.
http://www.cartacapital.com.br/sociedade/quem-sao-os-favoritos-para-substituir-bento-xvi/
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