DÁ DÓ A INCAPACIDADE DE DISTINGUIR MORAL DE ÉTICA
Fátima Oliveira, em O Tempo
fatimaoliveira@ig.com; @oliveirafatima_
A deputada estadual Myrian Rios, atriz e missionária da Canção Nova,
facção católica conservadora denominada renovação carismática, eleita em
2010 pelo PDT-RJ, hoje no PSD, exibe como foco do seu mandato
transformar em lei questões de sua moralidade. Uma distorção maligna
numa democracia.
Em “Myrian Rios e sua visão de dupla moral sobre a pedofilia”, eu
disse: “Ela tem todo o direito de professar a sua fé como desejar, desde
que não cause danos a outrem”. E finalizei: “Desconheço pronunciamento
da deputada a respeito da pedofilia clerical. Está passando da hora de
fazê-lo!” (O TEMPO, 28.6.2011).
Não o fez até hoje. E legisla a partir de sua dupla moral. Hábil em
se manter na raia da mídia, ela aprovou uma lei, sancionada pelo
desavisado governador, que prima por pretender encabrestar o viver do
povo do Rio de Janeiro numa moral única! Eis a Lei 6.394, de 16.1.2013
(D.O. de 17.1.2013):
“O Governador do Estado do Rio de Janeiro
Faço saber que a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro decreta e eu sanciono a seguinte lei:
Art. 1º. Fica instituído o “Programa de Resgate de Valores Morais,
Sociais, Éticos e Espirituais” no âmbito do Estado Rio de Janeiro.
Parágrafo único. O Programa deverá envolver diretamente a comunidade
escolar, a família, lideranças comunitárias, empresas públicas e
privadas, meios de comunicação, autoridades locais e estaduais e as
organizações não governamentais e comunidades religiosas, por meio de
atividades culturais, esportivas, literárias, mídia, entre outras, que
visem à reflexão sobre a necessidade da revisão sobre os valores morais,
sociais, éticos e espirituais.
Art. 2º. O Poder Executivo deverá firmar convênios e parcerias
articuladas e significativas, com prefeituras municipais e sociedade
civil, no sentido de possibilitar a execução do cumprimento ao disposto
nesta lei, com os seguintes objetivos:
I – promover o resgate da cidadania;
II – fortalecer as relações humanas;
III – valorizar a família, a escola e a comunidade como um todo.
Parágrafo único. Serão desenvolvidas ações essenciais que contribuam
para uma convivência saudável entre pessoas, estabelecendo relações de
confiança e respeito mútuo, alicerçada em valores éticos, morais,
sociais, afetivos e espirituais, como instrumento capaz de prevenir e
combater diversas formas de violência.
Art. 3º. O programa disposto no caput do Artigo 1º terá como órgão
gestor a Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos.
Art. 4º. As despesas decorrentes da execução desta lei correrão por
conta de dotações orçamentárias próprias, suplementadas, se necessário.
Art. 5º. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação”.
É lamentável que uma Assembleia Legislativa e um governador não
tenham percebido quão desrespeitosa é para uma democracia uma camisa de
força de moralidade que se pretende única para todo o povo. Dá dó que
tantas autoridades exibam analfabetismo filosófico: a incapacidade de
distinguir moral de ética.
Ora, as moralidades são muitas, pois são os costumes, os valores
relativos à pessoa ou a determinado agrupamento social, com unidade
ideológica, étnica, racial ou sexual. Assim é que há até moral bandida. A
ética nomeia os costumes ou os comportamentos relativos ao conjunto da
sociedade, dos povos, que são mundos inerentemente pluralistas.
Por espelhar a unidade a que chegaram as diferentes morais, a ética é
em si uma codificação da unidade possível das diferentes forças
políticas da sociedade.
http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/fatima-oliveira-uma-distorcao-maligna-de-myrian-rios.html
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