Estudo acadêmico feito pelo jornalista Eduardo Nunomura, na USP,
comprova que os meios de comunicação trataram o ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso como vítima de seus auxiliares e Lula como
co-responsável por escândalos, como o chamado mensalão; distorção mais
flagrante ocorreu na revista Veja, segundo demonstra sua dissertação de
mestrado
247 - Diante dos meios de comunicação, dois
ex-presidentes, Lula e FHC, não são exatamente iguais. É o que comprova
uma dissertação de mestrado apresentada pelo jornalista Eduardo
Nunomura, na USP. Segundo ele, FHC foi tratado como vítima de seus
auxiliares e Lula como co-responsável pelos escândalos. Leia, abaixo, o
texto de Suzana Singer, ombudsman da Folha, a respeito do estudo:
O mensalão em exame
Dissertação da USP compara as coberturas da Folha e da 'Veja' nos escândalos de Lula e FHC
Uma dissertação de mestrado defendida na USP no final do ano passado
põe o dedo na ferida: a imprensa foi excessivamente dura na cobertura do
governo Lula?
Para responder a essa pergunta, o jornalista Eduardo Nunomura, 44, que já trabalhou na Folha, no "Estado" e na "Veja" e que hoje se dedica à vida acadêmica, chafurdou nos arquivos de jornais e revistas.
Decidiu estudar Folha e "Veja", duas das publicações
mais vendidas no país, e, para ter um parâmetro de comparação,
pesquisou outros dois escândalos políticos, ocorridos durante o governo
de Fernando Henrique Cardoso.
Recuou até 1998 para avaliar como foi a cobertura do "dossiê Cayman",
aquele documento forjado que dizia que líderes do PSDB tinham contas em
paraíso fiscal, e também o "grampo do BNDES", as escutas telefônicas
ilegais que mostravam FHC e ministros discutindo o leilão da Telebrás, a
maior privatização já feita no Brasil.
Nunomura analisou 703 entradas (reportagens, editoriais, infográficos) sobre o mensalão e 215 sobre as denúncias tucanas.
A diferença quantitativa justifica-se porque o escândalo petista foi mais longo. NaFolha,
de junho a dezembro de 2005, foram publicadas 72 manchetes e 64
editoriais sobre o mensalão -em uma mesma edição de junho, saíram dois
editoriais sobre o escândalo (um na capa, outro na pág. 2). O leitor
ganhou praticamente uma manchete e um editorial a cada três dias.
As denúncias do governo FHC duraram menos, mas foram até mais
intensas. Em 35 dias de cobertura, renderam 15 manchetes e 10 editoriais
na Folha.
O escândalo tucano terminou mais rapidamente por falta de empenho da
imprensa ou as denúncias eram mais robustas no mensalão? Nunomura diz
que não há elementos para tirar essa dúvida.
É bom lembrar, no entanto, que o chamado "dossiê Cayman", um dos
objetos da dissertação, revelou-se, rapidamente, um documento
absolutamente falso.
O jornalista aponta uma "denunciação antecipada" na cobertura dos escândalos tucano e petista na Folha.
Ele dá esse nome ao açodamento da imprensa em publicar denúncias ao
primeiro sinal de suspeita, quase sempre com um viés de condenação
pública.
No mensalão, Nunomura menciona como exemplo do afã condenatório o fato de aFolha ter
citado o impeachment de Lula antes mesmo da oposição. Em editorial de
agosto de 2005, o jornal diz que "a hipótese de impeachment, remota até
poucos dias atrás, se afigura hoje como possibilidade palpável".
No escândalo tucano, quando o caso já estava minguando, a Folha retomou
a investigação e publicou os grampos. Em 25 maio de 1999, a manchete
dizia "FHC tomou partido de um dos grupos no leilão da Telebrás". Em 12
páginas, o jornal trazia os trechos mais comprometedores das conversas,
sob o selo "Segredos do Poder".
A conclusão do estudo é que, enquanto a "Veja" deu tratamento diferente aos escândalos tucano e petista, a Folha adotou um padrão semelhante em ambos.
A revista, segundo Nunomura, tratou FHC como vítima, seja dos erros
de seus auxiliares, seja da sua própria intenção de promover um bem para
o país. Com Lula, a "Veja" teria partido do princípio de que ele estava
envolvido no mensalão.
Já a Folha foi duríssima com Lula, mas também com
FHC. "Muito embora críticos da imprensa coloquem o jornal em franca
oposição ao PT (...), em momentos críticos, aFolha opta
pela lógica mercadológica em detrimento de eventuais preferências
ideológicas. No dizer popular, perde o amigo, mas não a piada", escreve
Nunomura.
Ele se surpreendeu com o resultado da pesquisa. Imaginava que seria
um massacre contra Lula. "Fui até rever os dados para ter certeza."
A dissertação é bem-vinda para refrescar a memória daqueles que
acreditam que as denúncias contra governos nasceram com a ascensão do PT
ao poder. Na Folha, os antecessores de Lula e Dilma
não foram tratados a pão de ló. Além de FHC, aposto que José Sarney e
Fernando Collor concordariam.
http://www.brasil247.com/pt/247/midiatech/102354/M%C3%ADdia-protegeu-FHC-e-pesou-a-m%C3%A3o-contra-Lula.htm
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