Este ano, uma das principais anomalias da democracia brasileira
emergirá com força. A proximidade do julgamento do “mensalão” do PT
revela que, dos três pilares da República (Executivo, Legislativo e
Judiciário), um não passou pela depuração da hegemonia conservadora
oriunda da ditadura.
A democracia tratou de equilibrar a correlação de forças políticas e
ideológicas nos Poderes Executivo e Legislativo. A renovação de quadros
que os processos eleitorais impõem a esses Poderes a cada quatro ou oito
anos (neste caso, nas eleições para o Senado Federal) permite que
acompanhem os anseios da sociedade por pluralidade.
Esse efeito benfazejo da democracia, porém, não atinge a terceira perna do tripé que sustenta a República, o Judiciário.
Ainda que a cúpula desse Poder seja designada pelos poderes Executivo
e Legislativo através da indicação dos membros do Supremo Tribunal
Federal pelo Executivo, com referendo do Legislativo, o resto do corpo
da Justiça brasileira ainda sofre os efeitos de décadas a fio de
controle conservador das instituições.
O funcionamento da Justiça brasileira, no varejo, mostra seu viés
conservador. Da juíza que mandou massacrar milhares de famílias do
bairro de Pinheirinho em São José dos Campos para beneficiar um ricaço
corrupto às decisões judiciais nos Estados que atendem aos interesses
das famílias midiáticas e de seus prepostos, é claro o viés
político-ideológico que distorce a Justiça.
Mesmo no Supremo Tribunal Federal, espanta constatar como o
julgamento do “mensalão” do PT, de interesse da direita midiática,
ultrapassou, temporalmente, o julgamento de escândalos mais antigos
(como o mensalão do PSDB mineiro), que se arrastam simplesmente porque a
mídia não se interessa por eles.
Bastou a mídia fazer pressão para o julgamento do mensalão ser
marcado, ultrapassando ilegalmente casos mais antigos que se arrastam.
Aí se tem a demonstração de que mesmo em um Supremo renovado pela
indicação de juízes sem vínculos políticos como os indicados pelos
governos anteriores ao de Lula, o poder de chantagem da mídia ainda
intimida a Justiça.
A desconfiança que a sociedade nutre em relação à Justiça transparece
da manchete de primeira página da Folha de São Paulo do primeiro dia
útil desta semana, que dá conta de que a CUT pode ir às ruas protestar
contra uma politização do julgamento do mensalão que vai se tornando
cada vez mais previsível.
Na verdade, o que um dos grupos de mídia que mais intimidam o
Judiciário noticia é apenas a ponta do iceberg de um imenso movimento de
resistência democrática contra o tribunal político em que as famílias
midiáticas e os partidos políticos que controlam devem tentar converter o
julgamento do mensalão, pois, além da CUT, todos sabem que esse
movimento em prol de um julgamento técnico deve açambarcar UNE, MST e
outras centrais sindicais.
Com efeito, o julgamento do mensalão será, também, o julgamento da
Justiça, pois algumas condenações, se ocorrerem, serão inaceitáveis
porque se darão sem prova alguma. Como no caso de José Dirceu, por
exemplo, que só pode sofrer alguma condenação se o julgamento for
político porque não há absolutamente nada, nesse processo, que o
incrimine.
Nas instâncias estaduais da Justiça, então, a situação é espantosa.
Desafetos dos barões da mídia sofrem condenações absurdas nas primeiras
instâncias enquanto que essa mídia e seus peões são blindados contra
qualquer reclamação pelos abusos que cometem.
Na Justiça paulista ou na carioca, por exemplo, qualquer um que
enfrente a mídia ou seus tenentes sabe que perderá, passando a ter
alguma chance apenas nas instâncias superiores, quando os processos
deixam a Justiça estadual.
Esse processo de partidarização e ideologização da Justiça, bem como
sua permeabilidade a pressões midiáticas, está se tornando cada dia mais
escandaloso. Jornalistas que se opõem aos partidos de direita e aos
grupos de mídia vêm sofrendo cerceamento do direito de defesa.
Recentemente, jornalistas que incomodam a Globo foram condenados em
ritos praticamente sumários, com seus processos “andando” em uma
velocidade que a Justiça dificilmente exibe e sob decisões escandalosas
que dispensam até, pasme-se, produção de provas pelas partes, dando
razão, in limine, aos prepostos da família Marinho.
Movimentos sociais e sociedade civil, portanto, organizam-se para
denunciar ao mundo a corrupção da Justiça pelos interesses da direita
midiática. As ruas serão o primeiro passo, mas a intenção é chegar aos
fóruns internacionais, pois o partidarismo da Justiça constitui a última
grande ameaça à democracia brasileira.
http://www.blogdacidadania.com.br/2012/07/partidarizacao-da-justica-ameaca-a-democracia-brasileira/
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