sexta-feira, 8 de julho de 2011

Jornalismo: novo modelo deixa patrões de pernas pro ar


Foto: Jota Jota Palacio-DIVULGAÇÃO



Entrevista com o professor e jornalista Rosental Calmon Alves revela dados alarmantes sobre a transformação da mídia impressa para a digital


06 de Julho de 2011 às 22:32

Por Claudio Julio Tognolli


“Não dá para continuar fazendo jornalismo do mesmo jeito. A decadência dos jornais nos EUA continua sendo um sinal de alerta para o resto do mundo, apesar das peculiaridades únicas daquele mercado. Nos últimos cinco anos, o faturamento de publicidade dos jornais americanos caiu 45% (regressou a níveis de 1983) e a circulação continuou a despencar. As redações dos jornais perderam quase a metade de seus jornalistas e as demissões continuam”.


O alerta é de ninguém menos que o professor e jornalista Rosental Calmon Alves, hoje considerado o maior consultor de mídia do planeta. Criador do primeiro jornal virtual da América Latina, o JB on line, Calmon Aves comanda o Centro Knight, em Austin, Texas - um núcleo catalisador de produção jornalística em todos os continentes. Dentre as atividades de Rosental, está o fomento de novas iniciativas no jornalismo, integração de associações e entidades jornalísticas, medição do pulso das novas tendências. As atividades diversificadas de Rosental fazem de sua vida uma itinerância continental: viaja o mundo o tempo todo. Nivela seu destino diariamente com os diretores e proprietários dos maiores jornais dos 4 continentes. Rosental é apontado como o Umberto Eco do século 21.


Os dados fornecidos por Rosental Calmon Alves ao Brasil 247 são no mínimo alarmantes: as vagas de jornalistas eliminadas nos jornais dos EUA desde que o centro de monitoramento “Paper Cuts” começou a contagem, em 2007, são de 21.008 em quatro anos e meio. O recorde foi em 2008, com 15.992 cortes. O ano de 2011 traz, até junho, 1.133 cortes.


“Quadro dramático similar se repete nas redações das emissoras de rádio e TV, que já eram pequenas”, revela Rosental. “A revolução digital impõe mudanças radicais e cria um novo ecossistema de mídia. A lenta ruptura dos modelos de negócio, produção e distribuição do jornalismo continuará impiedosamente. O jornalismo investigativo tem sido a primeira vítima dessa ruptura em muitas redações nos EUA. Já há resultados da mobilização nos EUA para salvar o jornalismo investigativo, por sua importância para a democracia. E vejo terreno fértil para o jornalismo investigativo florescer no novo ecossistema de mídia digital, que enfatiza transparência”, avalia. Para ele, um dos maiores fenômenos da evolução da mídia nos EUA é o jornalismo sem fins de lucro. Toda essa transição de ecossistemas de mídia precisa desta nova disciplina: jornalismo empreendedor”.


O modelo que se extingue é chamado por Rosental de “ecossistema industrial”, no qual ele aponta as seguintes características: escassez de informação, escassez de canais, altas barreiras de entrada de informação, altos custos de produção, tendência monopolista, comunicação vertical/unidirecional, limitação de tempo/espaço, pacotes fechados/estáticos, emprego de canais monomídia, audiência de massa, audiência passiva, pouco ou nenhum feedback/monólogo, produtor versus consumidor”.


O novo modelo de jornalismo é batizado por Rosental de “Ecossistema digital”. No qual ele aponta abundância de informação e de canais, baixas barreiras de entrada de informação, baixos custos de produção, mais concorrência, comunicação horizontal e multidirecional, sem limites de tempo/espaço, fluxos de informação aberta/dinâmica, canais multimídia, audiência diversa/mais nichos, audiência ativa, abundante feedback/conversação, mistura dos papéis de produtor e consumidor, o que nos EUA tem sido chamado de “prosumer”.


“A Revolução Digital impõe mudanças estruturais radicais que vão continuar nos próximos anos, décadas. Nunca uma revolução tecnológica afetou o jornalismo tanto e de forma tão abrangente. Já começou a ruptura dos modelos de negócio, de narrativas, de distribuição, de relacionamento com o público e com as fontes etc. As redes sociais mudaram o mundo e são o maior exemplo das mudanças extraordinárias que estão por vir”, vaticina Rosental.


Na onda de demissões e cortes orçamentários, o jornalismo investigativo tem sido a primeira vitima pelo alto custo e “baixa produtividade” (quantidade). Um dado fornecido por Rosental revela a redução de 21% no número de matérias submetidas ao Prêmio Pulitzer na categoria “reportagem investigativa”, ao comparar 1984-2010. E 43% de redução na categoria jornalística chamada de “interesse público” no mesmo período. Em 2006, 37% dos 100 maiores jornais não tinham repórteres investigativos: e só 10 tinham quatro.


“Neste mundo baseado em bases de dados, fica mais fácil ter acesso a informações públicas que nutrem reportagens investigativas e antes eram difíceis de obter e interpretar. Emergem formas colaborativas de jornalismo investigativo, desde a cooperação entre organizações jornalísticas que antes não se falavam até a participação do público. Digo que crowdsourcing ganhou lugar no centro do jornalismo, a reportagem investigativa também se beneficia com a sabedoria coletiva que antes não se podia capitalizar. O crowdfunding trouxe alento ao financiar pequenas iniciativas de jornalismo investigativo, sobretudo a nível local ou hiperlocal -- o cidadão pode influenciar a pauta jornalística”, avalia Rosental.


Ele sustenta que “nascido (ou renascido) no ecossistema da mídia digital, o novo jornalismo sem fins de lucro e um dos fenômenos mais importante do jornalismo americano hoje em dia. O fenômeno do jornalismo sem fins de lucro não ée exclusivo ou limitado aos Estados Unidos, embora as condições lá talvez sejam mais favoráveis que em outras partes”.


Rosental destaca que com fins de lucro ou sem fins de lucro, o futuro do jornalismo (ou jornalista) neste novo ecossistema de midia passa pelo empreendedorismo. “Uma nova disciplina nas universidades e empresas dos EUA, o jornalismo empreendedor enfatiza a inovação, a invenção, a descoberta de novos modelos sustentáveis para a produção jornalística.


Nenhum comentário: